Com a palavra, o índio: uma introdução ao estudo das representações no mundo Terena

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2006

RESUMO

O objetivo desta pesquisa foi evidenciar, por meio da análise de práticas discursivas, a relação entre a produção de discursos narrativos e as representações elaboradas acerca dos processos de aculturação e de (des)identificação do povo Terena, destacando mudanças e valores nos planos religioso, social, lingüístico e de afirmação étnica. O córpus é constituído por dezoito relatos orais e duas versões do mito de origem, em que buscamos a natureza das representações. Foram entrevistados dezoito índios Terena, de ambos os sexos e diferentes faixas etárias, das Aldeias Bananal, Ipegue, Imburussú, Lagoinha e Água Branca, situadas no município de Aquidauana-MS. Com base no princípio segundo o qual a análise lingüística pode ser um método para estudar a mudança social (FAIRCLOUGH, 2001), as análises focalizam as estruturas ou construções lingüísticas e a força dos enunciados (promessas, ordens, ameaças), procurando chegar à relação entre as práticas discursivas e as práticas sociais, bem como à identificação das transformações nas relações de poder representadas nas entrevistas. Organiza-se esta exposição em dois capítulos: no primeiro - "Conhecendo o povo Terena" -, encontra-se uma breve história da etnia, focalizando sua distribuição em terras brasileiras; o segundo - "Crenças e mitos: representações no mundo Terena" - estende-se de considerações sobre o conceito de mito e sua extensão nas sociedades contemporâneas até uma breve análise de duas versões escritas do mito de origem dos Terena e a análise das entrevistas. A pesquisa evidenciou a importância social da linguagem nas mudanças na vida social e sua influência nas relações e nas identidades sociais e, pois, nas práticas discursivas. A formação imaginária que se tem dos mais velhos é de sujeitos que sabem o que dizem porque trazem a herança enraizada da história de seu povo. Já a imagem que eles têm de si é de sujeitos subordinados às crenças e mitos do povo Terena, que, aceitando essa cultura, garantirão sua existência, reafirmando sua identidade. Mesmo o Terena mais jovem reconhece que os mais velhos têm autonomia para lhe falar "assim". Apenas um dos entrevistados (o mais jovem de todos) vê os mais velhos e seus discursos como herança passada, possivelmente por influência da escola e da cultura do branco, e, portanto, parece não ser mais afetado pelo discurso da tradição Terena. O lugar de enunciação, garantido lá no Mito de Origem, parece deslocar-se, no discurso das entrevistas: ali, alguns Terena já não falam do lugar de Terena, mas, como o não-índio, falam sobre o índio: parecem haver incorporado a imagem de que necessitam do outro para falar sobre e por eles. Na verdade, parecem assumir seu "pertencimento" a uma cultura que não é terena, comprovando o que historiadores e antropólogos têm discutido há décadas (senão séculos): os índios perderam a voz. Quanto ao preconceito e ao descaso exercidos pelo branco, são pouco visíveis, embora ainda presentes quando "colidem interesses da sociedade envolvente com os daqueles povos" (CABRAL, 2002, p. 10). O inverso também nos pareceu verdadeiro.

ASSUNTO(S)

terena indians discurso identity cultural changes identidade análise do discurso Índios terena discourse mudanças culturais letras

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