"Roda o balaio na porta da igreja, minha filha, que o santo é de candomblé...": os diferentes sentidos do sincretismo afro-católico na cidade de Salvador

AUTOR(ES)
DATA DE PUBLICAÇÃO

2001

RESUMO

Embora o fenômeno do sincretismo religioso seja observado em todos os tempos e lugares onde culturas diversas tiveram contato, no Brasil a palavra foi utilizada, pejorativamente, para caracterizar as religiões de origem africana como sinônimo de mistura, algo inautêntico e modelo religioso atrasado e incompleto. Ao lado de termos como animismo, feitichismo e primitivismo, a religião dos orixás, vodus e inquices foi, em muitos momentos, contraposta ao catolicismo, entendido como universal e autêntico. Desde Nina Rodrigues, acreditou-se de que a relação candomblé / catolicismo se dava apenas na superficialidade e poderia ser explicada .a partir da idéia da farsa e da dissimulação diante da obrigatoriedade do culto católico imposta ao africano. Se Nina Rodrigues colocou as bases para compreender a relação candomblé/catolicismo como algo que acontece de cima para baixo, outros autores realçaram que o contato das tradições de origem africana com o catolicismo resulta em perdas para os dois universos religiosos. Estas idéias não nos permite perceber as relações construídas pelos africanos, sobretudo "os últimos" diante das várias opções a eles apresentadas, no momento em que suas tradições foram reorganizadas. O sincretismo afro-católico vai além das relações exteriores estabelecidas com o catolicismo, exaustivamente exploradas pelos trabalhos anteriores. Este não pode ser explicado como imposições do sistema colonial, mas de modos ou estilos de viver e sobreviver inventados pelos africanos a partir de brechas encontradas no próprio catolicismo. O "viver em colônia" proporcionou a construção de uma série de relações constituídas ao longo do tempo, solidificadas através de sentimentos, que não podem ser desfeitas da noite para o dia, mesmo porque são sentidas de forma diferente por cada comunidade terreiro. O entendimento do candomblé como obrigação permite ainda hoje ao povo de santo incluir no seu universo simbólico o catolicismo como sua religião. Até mesmo o discurso anti-sincretista - que gira em torno da questão da identidade religiosa, razão pela qual rejeita as palavras que pejorativamente foram imputadas às religiões afro-brasileiras-, embora se posicione contra esta relação, não dissolve a questão, deixando-a para ser pensada como algo aberto, constituído a partir da história particular de cada casa, vivida como um segredo, recriado, redefinido e reinventado na hora certa

ASSUNTO(S)

candomblé religiões afro-brasileiras ciencias sociais aplicadas sincretismo afro-católico catolicismo

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