Projeto Lopes Rodrigues: continuidades e rupturas nas conexões entre ensino psiquiátrico e prática assistencial em Minas Gerais (1920-1930)

AUTOR(ES)
DATA DE PUBLICAÇÃO

2008

RESUMO

O ensino de psiquiatria no contexto brasileiro do início do século XX é examinado, através de um estudo de caso da Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais no período compreendido entre 1920 e 1930. São analisadas as condições de sustentação de um ensino médico articulado com as teorias psiquiátricas e as práticas assistenciais, tomando-se como eixo o projeto empreendido pelo professor de psiquiatria Hermelino Lopes Rodrigues (1898-1971) em Belo Horizonte. O Projeto Lopes Rodrigues, iniciado em 1929, foi idealizado com o objetivo de conectar o ensino acadêmico na Faculdade de Medicina com as práticas de assistência aos doentes mentais utilizadas no Instituto Raul Soares. Nesse hospital público, os indivíduos que apresentavam distúrbios mentais e/ou comportamentos considerados anti-sociais eram anteriormente internados e submetidos a tratamentos desumanos, incluindo o uso de violência física contra os pacientes. Buscando compreender as ações de Lopes Rodrigues no sentido de humanizar esses tratamentos, e as relações dessas ações com a história da psiquiatria e do ensino dessa ciência, foi utilizado o enfoque teórico e metodológico proposto por Bruno Latour, no qual a atividade científica é analisada em suas relações com o contexto social e cultural através da metáfora de um sistema circulatório. Nesse sistema, são considerados cinco circuitos que se integram para possibilitar a emergência dos estudos científicos: a mobilização do mundo, a autonomização, as alianças, a representação pública e os vínculos e nós. A utilização, por parte de Lopes Rodrigues, das teorias psiquiátricas originadas na Europa e disseminadas no Brasil a partir do trabalho de Juliano Moreira no Hospício Nacional, no Rio de Janeiro, foi analisada a partir do conceito de apropriação desenvolvido por Roger Chartier. Este autor demonstra que a transmissão de conhecimento não se dá de forma passiva por parte do receptor. Este, ao contrário, realiza um trabalho próprio de transformação sobre o conhecimento recebido. Foram analisadas variadas fontes de pesquisa, tais como jornais de época, revistas científicas e de circulação popular, além de documentos pedagógicos como atas de reuniões ou material de circulação interna da Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais. Como principal resultado da análise do cruzamento dessas fontes, foi evidenciado que o Projeto Lopes Rodrigues não conseguiu incluir satisfatoriamente o ensino psiquiátrico na dinâmica de articulação entre conhecimento teórico e aplicação assistencial. A partir da perspectiva de Bruno Latour sobre a necessidade de fortalecer variadas conexões para a sustentação de um projeto científico, e do estudo do caso em questão, conclui-se que a articulação entre conhecimento teórico e prática assistencial no ensino médico é fundamental para a formação do psiquiatra. Além disso, em relação ao Projeto Lopes Rodrigues, conclui-se que seu idealizador não conseguiu realizar as conexões e articulações necessárias para a sustentação de seu projeto, principalmente por não incluir nele dimensões importantes apontadas pela metodologia de Bruno Latour nos estudos científicos.

ASSUNTO(S)

educação teses assistência social psiquiatria  estudo de casos hospitais psiquiátricos doenças mentais  tratamento

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