Pés descalços e tênis, carroça e carro, boneca de pano e computador, entre o rural e o urbano : experiências num entrecruzar de infâncias

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2011

RESUMO

A presente Dissertação buscou compreender, a partir de uma pesquisa de campo, as visões que as crianças “urbanas” e “rurais” produzem sobre si e sobre os outros, procurando entender suas formas de falar, narrar, expressar para refletir sobre o quanto a polifonia de discursos sobre o que é rural e urbano reverberou em seus modos de pensar. Esta pesquisa movimentou-me por uma temática na qual eu estava envolvida, atravessada, mobilizada. Como professora-pesquisadora, articulei episódios que emergiram em minha experiência pedagógica, os quais me convocaram a problematizar posicionamentos e diferentes dizeres relacionados ao rural. Entendo que os discursos sobre as infâncias “rurais” disseminados em diferentes produções culturais provocam modos de vermos estas infâncias de uma forma um tanto semelhante e reiterada, colocando-a muitas vezes como uma infância em defasagem em relação à infância “urbana”. Além de me ater às produções culturais e alguns artefatos, realizo uma análise mais ampla de como as ideias sobre o rural e a infância “rural”, em especial, foram sendo constituídas na cultura brasileira ao longo da nossa formação social, política, cultural, discutindo sobre como a cultura, de um modo geral, define e nos ensina o que é rural e urbano. Tomo como ferramentas teóricas os Estudos Pós-Estruturalistas em Educação, em especial os Estudos Culturais e da Cultura Visual e dos Estudos Contemporâneos sobre as Infâncias. A investigação foi realizada com doze crianças com idades entre seis e sete anos de idade, residentes no meio urbano e no meio rural do município de Estrela-RS, no período de março a dezembro de 2008. Para uma melhor apreensão das concepções das crianças, criei, no desenvolvimento da pesquisa, uma proposta de intercâmbio de materiais entre elas e um conjunto de estratégias de comunicação entre as crianças: auto-retratos desenhados, fotografias, postais e vídeos. O início da pesquisa com as crianças apontou o quanto suas narrativas estavam marcadas por referentes, acentuados por binarismos que de certa forma inferiorizavam os saberes e as práticas do meio rural. A partir do intercâmbio dos materiais entre as crianças “rurais” e “urbanas,” algumas concepções que os diferentes grupos tinham um sobre o outro foram se modificando. As perguntas centrais do trabalho: Como as crianças “rurais” e “urbanas” narram a si mesmas? Como as crianças percebem o meio rural e o meio urbano? foram respondidas nas análises realizadas, que permitem argumentar que este espaço de “narrar o outro” e “narrar-se ao outro” mostrou o quanto a descrição das crianças “rurais” e “urbanas” foi marcada pelo “ser-ter-pertencer”. Pelo que se pode perceber na pesquisa, as formas de narrar das crianças estão relacionadas à questão de posse, das características físicas e intelectuais, através das formas de narrar o espaço e os saberes dos outros, a respeito dos lugares “rurais” e “urbanos”, da alimentação e da expressão verbal. Independentemente das crianças serem “urbanas” ou “rurais”, na contemporaneidade, percebi o quanto este “narrar-se” passa também pela aparência, pelo modo de ser, de se vestir, de ter, das brincadeiras e brinquedos. O “rural,” que apareceu inicialmente relatado nas vozes das crianças como espaço de atraso, do não ter as mesmas coisas que o “urbano”, como se o meio urbano fosse a fonte do ter, do saber, do lugar de consumo onde se pode adquirir as coisas “boas” e “importantes,” começou a ganhar outros contornos. Pude verificar que mudaram os dizeres das crianças a partir do momento em que as cartas, os postais e os vídeos foram chegando. Aquele olhar tão definido, estável, fixo, de certezas, deu lugar à instabilidade, a outras formas de perceber o lugar “do outro”. Ao intercambiarem os materiais por elas produzidos, crianças “rurais” e “urbanas” puderam perceber que cada lugar, seja ele na cidade ou no meio rural, tem suas particularidades. Nestas trocas as crianças passaram a conhecer outras narrativas, que apontaram o quanto há de diverso e semelhante entre elas.

ASSUNTO(S)

childhood infância criança children rural children urban espaço rural espaço urbano visual work cultural work produção visual produção cultural narrative narrativa estrela (rs)

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