Efeitos dos principais ácidos graxos acumulados na deficiência da desidrogenase de acil-coa de cadeia média sobre homeostase energética mitocondrial e parâmetros de estresse oxidativo em cérebro de ratos jovens
AUTOR(ES)
Schuck, Patrícia Fernanda
DATA DE PUBLICAÇÃO
2009
RESUMO
A deficiência da desidrogenase de acil-CoA de cadeia média (MCAD) é o mais frequente defeito de oxidação de ácidos graxos, caracterizado bioquimicamente pelo acúmulo tecidual predominante dos ácidos graxos de cadeia média octanoato (AO), decanoato (AD) e cis-4-decenoato (AcD). Embora os sinais clínicos dos afetados sejam fundamentalmente neurológicos, os mecanismos fisiopatológicos do dano do sistema nervoso central apresentado pelos pacientes afetados por esse distúrbio ainda não estão esclarecidos. Tem sido, no entanto, levantada a hipótese de que os ácidos graxos acumulados nesta doença possam exercer efeitos tóxicos. Neste cenário, o objetivo do presente trabalho foi investigar os efeitos in vitro dos ácidos AO, AD e AcD sobre parâmetros de função mitocondrial e de estresse oxidativo em cérebro de ratos de 30 dias de vida, uma vez que o metabolismo energético é muito ativo e as defesas antioxidantes estão diminuídas neste tecido. Inicialmente, observamos que todos os ácidos graxos testados dimuíram o potencial de membrana mitocondrial em preparações mitocondriais de cérebro de ratos, sendo que as concentrações mais altas testadas do AD e do AcD exerceram efeitos comparáveis ao de um clássico desacoplador da fosforilação oxidativa, sugerindo que estes ácidos graxos atuem como desacopladores. Os ácidos AO, AD e AcD também aumentaram o estado 4 da respiração mitocondrial e diminuíram os valores do índice de controle respiratório. Além disso, o AD e o AcD diminuíram o estado 3 da respiração tanto com glutamato/malato quanto com succinato como substratos, enquanto que o AO dimiuiu o mesmo parâmetro apenas com o succinato. Também encontramos uma diminuição na razão ADP/O na presença de AD e AcD. O atractilosídeo, inibidor do translocador de nucleotídeos de adenina (ANT), foi capaz de impedir parcialmente o efeito desacoplador do AD, sem alterar os efeitos do AO e do AcD, sugerindo um envolvimento deste translocador no efeito desacoplador do AD. O AO e o AD também diminuíram o consumo de oxigênio em mitocôndrias desacopladas. O AcD também diminuiu a produção de peróxido de hidrogênio, sendo seu efeito maior do que o da rotenona, que inibe o fluxo reverso de elétrons. Os AO e AD diminuíram as atividades dos complexos I-III e IV da cadeia transportadora de elétrons, e o AD também inibiu a atividade do complexo II-III. Todos os três ácidos graxos testados diminuíram o conteúdo de equivalentes reduzidos de NAD(P)H na matriz mitocondrial e a posterior adição de rotenona apenas reverteu o efeito do AO, sugerindo que estes equivalentes estejam sendo perdidos para o meio extramitocondrial. Os ácidos AD e AcD também induziram um maior inchamento mitocondrial, sugerindo que estes ácidos graxos possam atuar como desacopladores provavelmente devido a uma permeabilização nãoseletiva da membrana mitocondrial interna. Também avaliamos o efeito dos mesmos ácidos graxos sobre parâmetros de estresse oxidativo. Observamos que o AO, o AD e o AcD induziram um aumento na peroxidação lipídica em córtex cerebral de ratos, evidenciado por um aumento nos níveis de substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico (TBA-RS) e na medida de quimioluminescência espontânea. Os AD e AcD também causaram dano oxidativo proteico, visto que aumentaram o conteúdo de carbonilas e diminuíram o conteúdo de grupamentos sulfidrila. Além disso, todos os ácidos graxos testados diminuíram as defesas antioxidantes não-enzimáticas, evidenciado pela diminuição do potencial antioxidante total do tecido (TRAP). Entretanto apenas o AD e o AcD diminuíram os níveis de glutationa reduzida (GSH), o principal antioxidante não-enzimático presente no cérebro. O AcD não ocasionou um aumento nos níveis de TBA-RS em preparações mitocondriais de cérebro de ratos, sugerindo que outros componenentes celulares sejam essenciais para os efeitos pró-oxidantes deste ácido graxo. Entretanto, não foi observado nenhum efeito do AD sobre níveis de GSH e o conteúdo de grupamentos sulfidrila em preparações citosólicas, sugerindo um papel para a mitocôndria nos efeitos causados por este ácido graxo. Devemos também enfatizar que os efeitos mais pronunciados foram verificados pelo AcD, seguido do AD e por último do AO. Estes resultados, tomados em seu conjunto, indicam que os principais metabólitos acumulados na deficiência de MCAD exercem efeitos neurotóxicos importantes. Dessa forma, é possível que uma disfunção mitocondrial e o estresse oxidativo, possivelmente com outros mecanismos, atuem sinergicamente, colaborando para o dano neurológico apresentado pelos pacientes afetados pela deficiência da MCAD.
ASSUNTO(S)
erros inatos do metabolismo Ácidos graxos estresse oxidativo metabolismo energetico acil coenzima a fosforilação oxidativa
ACESSO AO ARTIGO
http://hdl.handle.net/10183/16275Documentos Relacionados
- Investigação dos efeitos de ácidos graxos de cadeia longa hidroxilada acumulados nas deficiências da desidrogenase de hidroxiacil-coa de cadeia longa e da proteína trifuncional mitocondrial sobre parâmetros de estresse oxidativo e homeostase mitocondrial em cérebro de ratos jovens
- Efeitos in vitro de metabólitos acumulados na deficiência da acil-CoA desidrogenase de cadeia média (MCAD) sobre parâmetros do metabolismo energético em córtex cerebral de ratos jovens
- Efeitos in vitro e ex vivo dos ácidos metilmalônico e propiônico sobre importantes parâmetros de estresse oxidativo em cérebro de ratos jovens
- Efeito in vitro dos ácidos fenilpirúvico, feniláctico e fenilacético sobre parâmetros de estresse oxidativo em cérebro de ratos jovens
- Efeito in vitro dos principais metabólitos acumulados na doença do xarope do bordo sobre parâmetros da função mitocondrial em preparações mitocondriais de cérebro de ratos jovens