Variação na estrutura da comunidade de aranhas (araneae, arachnida) ao longo da calha do Rio Amazonas, Brasil

AUTOR(ES)
DATA DE PUBLICAÇÃO

2009

RESUMO

Na Amazônia, as florestas inundadas por rios de água-branca, de aspecto leitoso devido à grande quantidade de sedimentos oriundos dos Andes são chamadas de várzeas. A sua drenagem é feita principalmente pelo Rio Amazonas, cujo nível dágua é controlado pelo degelo da Cordilheira dos Andes. As florestas ao norte, no Escudo das Guianas, são drenadas pelo Rio Negro, o maior afluente do Amazonas. Estes e outras centenas de grandes rios alagam anualmente uma área de 100 a 250 mil km2. As várzeas estão presentes ao longo de todo o Rio Amazonas e permanecem alagadas de 4 a 6 meses por ano, o que exige adaptações dos organismos aos períodos de cheia. Na várzea, as condições climáticas, a paisagem e os tipos de vegetação variam com a longitude e a riqueza de diversos taxa como aves, formigas, árvores e aranhas diminui no sentido Andes-Atlântico. No Alto Amazonas, as árvores são altas, grossas e a precipitação é maior do que no Baixo Amazonas, onde o clima é mais seco e a presença de áreas mais abertas com baixa densidade de lenhosas é comum. Ao longo da calha Brasileira do Rio Amazonas (cerca de 3000 km), aproximadamente 11 mil aranhas (30% adultas) de 384 espécies pertencentes a 34 famílias foram coletadas, das quais 26,6% (112) foram identificadas até espécie. Cerca de 70% das espécies tiveram menos de cinco indivíduos observados e o padrão de abundância da araneofauna foi típico das florestas tropicais. Uma análise de correspondência canônica parcial (CCAp) mostrou que parte da variação na estrutura da araneofauna da várzea (9,9%) foi devido à proporção entre áreas secas e alagadas e à presença do Rio Negro. Quase metade das espécies (48, 6%, excluindo as ocorrências únicas) foi coletada apenas a leste ou apenas a oeste desse rio ao longo do Amazonas. A presença de lagos, ilhas, terra-firme (floresta não-alagada) e a precipitação nos três meses mais secos afetaram a composição da araneofauna, independentemente da longitude (distância entre as amostras). Pouco mais da metade das aranhas ocorreram ao longo de quase toda a calha do Rio Amazonas. Desta forma, não foram observados padrões de distribuição das espécies e das guildas de aranhas ao longo da várzea segundo as variáveis ambientais e climáticas. Entretanto, foram constatadas diferenças entre famílias cujas espécies são na maioria semi-aquáticas (Tetragnathidae, Lycosidae e Pisauridae) e famílias de espécies que habitam ambientes mais secos (Araneidae, Mimetidae, Salticidae e Thomisidae). O Rio Negro afetou a composição de espécies e pode ser uma barreira para a dispersão e o fluxo gênico de aranhas. A comparação da seqüência do gene CO1 do DNA mitocondrial (mtDNA) de duas espécies errantes e de ampla distribuição ao longo do Rio Amazonas, Thaumasia annulipes (Pisauridae) e Ctenus sp. (Ctenidae) revelaram que ambas as espécies não possuem (compartilham) haplótipos comuns entre as populações situadas a leste e a oeste do Rio Negro. A variação da população de T. annulipes foi menor entre as margens (6%) do que dentre as margens (94%) do Rio Negro. Por outro lado, a diversidade genética de Ctenus sp. foi maior entre as margens opostas (91%) do que dentre as margens do Rio Negro (9%). Esta diferença foi causada principalmente pelo modo como estas espécies se dispersam. T. annulipes é capaz de se dispersarem por longas distâncias por meio do vento (balonismo) e consegue atravessar rios e lagos. Por outro lado, Ctenus sp. é mais séssil, se afasta pouco de suas tocas e o fluxo gênico entre as populações separadas a mais de 500 km é pequeno. A maior diversidade de haplótipos de Ctenus sp. na Amazônia Ocidental sugeriu que eventos históricos também atuaram no fluxo gênico das espécies. Hipóteses baseadas na história geológica da Amazônia foram discutidas e, a principal delas, sugeriu que a formação do Lago Pebas, no Mioceno, inundou a parte oeste do Rio Negro. Este evento isolou as espécies em arquipélagos desde a Amazônia Ocidental até o Escudo das Guianas e promoveu a diversificação alopátrica dos haplótipos da população de Ctenus sp..

ASSUNTO(S)

amazônia rio negro filogeografia ecologia aranhas rio amazonas

Documentos Relacionados