Uso atual de talidomida e defeitos congênitos no Brasil

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2009

RESUMO

A tragédia da talidomida na década de 1960 resultou no nascimento de aproximadamente doze mil crianças em todo o mundo com uma grande diversidade de defeitos congênitos (DC), sendo os mais notáveis os defeitos de redução de membros (DRM) do tipo pré-axial e intercalar, principalmente a focomelia, que poderiam ou não estar associados a outras malformações. Após esse episódio, diversos sistemas de vigilância de DC foram criados em todo o mundo a fim de evitar novas tragédias e monitorar as freqüências dos DC ao longo dos anos; e os DRM passaram a ser considerados particularmente sensíveis a agentes teratogênicos. Atualmente sabe-se que a talidomida tem importantes propriedades imunomoduladoras e antiangiogênicas, que trazem benefícios terapêuticos para um grande número de doenças, entre elas doenças dermatológicas, crônico-degenerativas e cânceres. No Brasil, a talidomida está aprovada para o tratamento de poucas condições, como o eritema nodoso da hanseníase, reação relacionada a uma doença ainda muito prevalente no país. Embora existam restrições para prescrição e uso por mulheres em idade fértil, o surgimento de novos casos de embriopatia por talidomida (ET) em anos recentes no Brasil, indica a possibilidade de ocorrência de outros casos não diagnosticados. Nosso objetivo foi implementar um sistema de vigilância epidemiológica de defeitos de redução de membros dirigido fundamentalmente para identificação de casos de ET em nascimentos ocorridos em 33 hospitais do Brasil participantes do Estudo Colaborativo Latino Americano de Malformações Congênitas (ECLAMC), no período de março de 2007 a fevereiro de 2008. Para isso, as características epidemiológicas dos DRM foram avaliadas nos anos de 2000-2006 e foi estabelecido um fenótipo de DRM para vigilância de ET, o qual inclui os DRM pré-axias, intercalares, combinados e amelias, denominado DRMTALIDO. A freqüência de DRM no período base (2000-2006) para o Brasil foi de 8,59/10000 nascimentos (IC 95%: 7,50 – 9,80), estatisticamente superior quando comparada a todos os outros países participantes do ECLAMC (6,83/10000 nascimentos; IC 95%: 6,40 – 7,30). Os DRM mais freqüentemente observados, em ordem decrescente, no período base, foram: transverso, pré-axial, intercalar, pós-axial, casos com mais de um tipo de DRM (chamado de combinados) e DRM axiais. A freqüência de DRMTALIDO no período base foi de 3,57/10000 nascimentos (IC 95%: 2,90 – 4,40). Durante o ano de vigilância a freqüência de DRM avaliada foi de 10,17/10000 nascimentos (IC95%: 8,20 – 12,40). Os DRM mais freqüentemente visualizados seguiram o mesmo padrão do período base, embora os defeitos combinados tenham apresentado a segunda maior freqüência, seguindo a tendência observada em 2004-2006 no período base. Além disso, os DRM intercalares, que no período base apresentaram tendência ao crescimento, não seguiram esse comportamento no período de vigilância. A freqüência de DRMTALIDO durante o último ano foi de 4,55/10000 nascimentos (IC 95%: 3,30 – 6,10). A região Sudeste do Brasil obteve as maiores taxas de DRM, que são explicadas pelos altos índices de DC registrados nos hospitais de referência inseridos nessa região. A região Sul possui a menor freqüência para o período base. Ainda que os dados disponíveis para região Norte e Centro-oeste sejam muito pequenos, eles são essenciais para vigilância de ET, já que essas regiões representam os maiores focos de hanseníase no Brasil. Foram identificados três casos suspeitos de ET, dois no Nordeste e um no Sudeste. Embora não exista a confirmação materna de uso da talidomida, este é um número preocupante, já que o esperado para essa síndrome deveria ser zero. A avaliação dos DRM no período base nos forneceu dados para realizar a vigilância prospectivamente não só dos DRMTALIDO, mas também de todos os outros DRM, para todo o Brasil e para cada região separadamente. Essa é uma ferramenta importante para o monitoramento dos DRM ao longo dos anos, e pode identificar aumentos nas freqüências de DRM e indicar a possível presença de teratógenos. Os resultados aqui encontrados também possibilitam o estudo mais aprofundado na busca da etiologia dos DRM na América do Sul.

ASSUNTO(S)

talidomida brasil defeitos congênitos genética

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