Prevalência de toxoplasmose aguda em gestantes, incidência de toxoplasmose congênita e desempenho de testes diagnósticos em toxoplasmose congênita

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2007

RESUMO

Introdução: A infecção aguda pelo Toxoplasma gondii em gestantes pode determinar infecção fetal através de passagem transplacentária. As crianças afetadas podem desenvolver coriorretinite e déficit neurológico, na ausência de tratamento adequado. Objetivos: Estimar a prevalência de toxoplasmose aguda em gestantes atendidas na maternidade do Hospital Nossa Senhora da Conceição, avaliando possíveis diferenças nas freqüências ao longo do período estudado; medir a incidência de toxoplasmose congênita (TC) e estimar a taxa de transmissão vertical em crianças nascidas neste hospital; avaliar a acurácia de testes diagnósticos em TC, aplicados no momento do nascimento, na população de crianças estudadas. Métodos: Inicialmente um estudo transversal foi desenvolvido para identificar as pacientes que apresentaram critérios de infecção aguda na gestação, atendidas na maternidade no momento do parto, entre outubro de 1998 e dezembro de 2005. Novas tecnologias foram introduzidas para detecção diagnóstica ao longo deste período. Entre outubro de 1998 e dezembro de 2001 (período 1), utilizou-se o método microparticle enzyme immunoassay – MEIA e entre janeiro de 2002 e dezembro de 2005 (período 2) foi utilizada a técnica de captura de IgM e o teste de avidez de IgG com o método enzyme linked fluorescent assay – ELFA (VIDAS). Os recém-nascidos identificados a partir deste estudo inicial foram incluídos em um estudo de coorte histórico, com tempo de acompanhamento aproximado de doze meses, para estabelecer o diagnóstico definitivo de toxoplasmose congênita, obtido em dois momentos: (1) logo após o nascimento; (2) aos 12 meses, aproximadamente. Para a definição de caso da infecção aguda na gestação e de toxoplasmose congênita foi utilizado o sistema de classificação elaborado por Lebech et al., com adaptações (quadro 1). Aqueles casos classificados como improváveis foram excluídos do cálculo da prevalência de toxoplasmose aguda em gestantes e de incidência de TC. Para avaliar a acurácia de testes diagnósticos em TC realizados no momento do nascimento utilizou-se, como padrão ouro para o diagnóstico definitivo, a concentração de anticorpos IgG em torno de 12 meses de vida. Um bebê infectado deve ter concentrações iguais ou mais elevadas de IgG nesta idade quando comparadas às encontradas no nascimento. Houve comparação independente e cega dos métodos diagnósticos avaliados em relação ao padrão ouro. A dosagem de anticorpos IgG e IgM em recém-nascidos foi processada com o método microparticle enzyme immunoassay (MEIA). Análise: Para comparar proporções foi utilizado o teste qui-quadrado com correção de Yates, teste exato de Fisher, quando necessário, e Teste t de Student para comparação entre médias de duas amostras independentes com distribuição simétrica. Na avaliação do desempenho de testes diagnósticos foram obtidos resultados de sensibilidade, especificidade, razões de verossimilhança (RV) positiva e negativa dos testes diagnósticos – hemograma, exame do líquor, ecografia transfontanelar, exame de fundo de olho (EFO) e a detecção de anticorpos IgM para toxoplasmose (MEIA) e do DNA do toxoplasma com reação em cadeia da polimerase – método Nested (RCP-Nested) séricos. Resultados: Em uma população de 41.112 gestantes, a prevalência de toxoplasmose aguda foi de 4,8 para cada 1.000 gestantes (IC95%: 4,2 a 5,6). Houve redução significativa na prevalência de toxoplasmose aguda nas gestantes deste hospital a partir do ano 2002 (P=0,008). O diagnóstico de toxoplasmose congênita foi definitivo em 37 crianças entre 40.727 nascidos vivos no período estudado, atingindo uma incidência de 0,9 para cada 1.000 nascimentos (IC95%: 0,6 a 1,3). Logo após o nascimento, entre os 200 recém-nascidos expostos ao T. gondii, resultado de 199 gestantes infectadas, 25 bebês apresentaram critérios diagnósticos de toxoplasmose congênita, atingindo taxa de transmissão vertical de 12,5% (IC 95%: 8,2% - 17,9%). Após o seguimento foram detectados mais 12 casos, aumentando esta taxa para 18,5% (IC 95%: 13,4% – 24,6%). Para avaliar a acurácia de testes diagnósticos aplicados no momento do nascimento, foram identificadas 31 crianças com TC, de acordo com o padrão ouro, entre 136 expostas ao protozoário intra-útero e que completaram seguimento até os 12 meses de vida. Os testes que apresentaram melhor desempenho isoladamente na predição do diagnóstico, foram detecção de anticorpos IgM específicos, EFO e RCPNested atingindo razões de verossimilhança positivas de 119,3 (IC95%: 7,40 – 1923,92), 49,9 (IC95%: 3,0 – 838,2) e 24,8 (IC95%: 3,22 – 190,35), respectivamente. A RV negativa para IgM foi 0,4 (IC95%: 0,3 – 0,6), mas para o EFO e RCP-Nested foi apenas 0,7 (IC95%: 0,6 – 0,9). Conclusão: A prevalência de toxoplasmose aguda em gestantes incluídas neste estudo foi inferior à encontrada na França e na Bélgica, mas foi mais elevada quando comparada às descritas na Suécia, Noruega, Dinamarca e Nova Iorque. A prevalência estimada neste estudo foi similar a de outros locais do Brasil, como Mato Grosso do Sul, mas inferior à obtida no Distrito Federal. Esta variabilidade nas estimativas pode estar relacionada com os diferentes métodos diagnósticos utilizados no rastreamento, ou ainda, com os diferentes fatores de risco envolvidos na transmissão da doença. Em nosso estudo, esta freqüência diminuiu a partir do ano de 2002, o que não pode ser atribuível à introdução do teste de avidez de IgG, uma vez que a média de idade gestacional na realização deste exame foi tardia. Entretanto, existe a possibilidade de que o teste de captura de IgM com o método ELFA tenha contribuído para diminuir os casos falso-positivos de IgM, o que poderá ser confirmado com futuros estudos. Estes resultados apontam que a introdução de novas tecnologias no laboratório deve ser acompanhada de esforços para melhorar as condições de acesso precoce das gestantes ao pré-natal de referência, com o objetivo de não perder a oportunidade para melhor discriminar as gestantes sem doença e evitar procedimentos invasivos, desnecessários e onerosos. A incidência de toxoplasmose congênita e a taxa de transmissão vertical foram elevadas. Estas freqüências podem estar subestimadas devido às perdas no seguimento. Para avaliar o efeito das perdas na validade do estudo, foram comparadas as características da população de gestantes e de recém-nascidos do grupo de bebês com seguimento completo em relação ao grupo que não retornou para o seguimento. Estas características foram semelhantes nos dois grupos, portanto, consideramos que o percentual de perdas, embora elevado, não prejudicou a validade do estudo. A identificação de 12 casos adicionais de TC com o seguimento dos bebês reforça a necessidade de monitoramento sorológico durante o primeiro ano de vida, mesmo sem evidência de infecção congênita ao nascimento. Na avaliação dos testes diagnósticos aplicados ao nascimento, a detecção de anticorpos IgM específicos no sangue do neonato, o EFO e o RCP-Nested sérico demonstraram melhor desempenho para identificar os bebês com TC. Entretanto, para afastar este diagnóstico, apenas o resultado não reagente de anticorpos IgM específicos apresentou maior utilidade, mas com efeito de pequena magnitude.

ASSUNTO(S)

toxoplasmose congênita toxoplasma gondii transmissão vertical de doença congenital toxoplasmosis disease transmission vertical diagnosis

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