Filogeografia comparada e história evolutiva da Planície Costeira Sul e Sudeste do Brasil

AUTOR(ES)
DATA DE PUBLICAÇÃO

2008

RESUMO

O ambiente costeiro e marinho se caracteriza pela falta de barreiras físicas aparentes, além de ser rico em espécies que possuem fase de desenvolvimento larval livre natante. Devido a esta fase de desenvolvimento larval, as espécies marinhas geralmente apresentam alta capacidade dispersiva, proporcionando alto fluxo gênico e conseqüentemente baixa estruturação populacional. Por outro lado, algumas espécies têm apresentado padrões filogeográficos que não são compatíveis com este cenário clássico. Assim, fatores como tempo de duração da fase larval, predação da larva e o hidrodinamismo podem interferir de maneira significativa na dispersão das espécies. Além disso, fatores ambientais históricos, tais como as grandes mudanças climáticas do Pleistoceno também influenciaram os padrões de diversidade genética das espécies. Neste sentido, estudos comparativos são importantes ferramentas para o entendimento dos diferentes processos que deram origem à atual diversidade. Porém, poucos estudos filogeográficos comparativos foram realizados em espécies marinhas costeiras, em especial nenhum para a costa atlântica da América do Sul. Neste estudo comparamos os padrões de diversidade genética de quatro espécies abundantes de invertebrados que ocorrem ao longo da costa sul-sudeste do Brasil, Uruguai e Argentina, com o objetivo de entender a história evolutiva destas espécies e o que elas podem contar sobre esta região geográfica. Sequenciamos parte do gene mitocondrial Citocromo Oxidase I do moçambique Donax hanleyanus (n= 247), do marisco branco Mesodesma mactroides (n= 59), da tatuíra Emerita brasiliensis (n= 191) e do caranguejo maria-farinha Ocypode quadrata (n= 135). Análises filogeográficas e populacionais foram utilizadas a fim de elucidar e comparar os padrões evolutivos para estas espécies de invertebrados costeiros. Nossos dados revelaram um padrão de variabilidade genética muito baixa para todas as espécies, apesar de apresentarem ampla distribuição geográfica e populações censitárias gigantescas, demonstrando a grande influência das flutuações populacionais históricas na formação da variabilidade genética atual. Apenas E. brasiliensis apresentou uma maior variabilidade ao norte da sua distribuição o que é compatível com expansão populacional recente a partir de algum refúgio de baixa latitude, neste caso, ao norte. Além disto, foi a única espécie a apresentar indicação de isolamento por distância. As histórias demográficas destas espécies, apesar de apresentarem algumas diferenças, parecem estar intimamente ligadas às flutuações de temperatura durante o último grande ciclo glacial, pois três delas apresentaram ancestral comum mais recente (time to most recent commom ancestor – TMRCA) dentro dos 100 mil últimos anos, com exceção de O. quadrata, que apresentou TMRCA há cerca de 500 mil anos. Para todas as espécies constatamos a ocorrência de um longo período de estabilidade demográfica (população reduzida) com expansão populacional mais recente, com exceção de M. mactroides, que apresentou TMRCA e expansão populacional praticamente simultâneos. Emerita brasiliensis foi a espécie com a história demográfica mais recente, apresentando expansão populacional após o último máximo glacial (21 mil anos atrás), e coalescência há cerca de 60 mil anos. As demais espécies apresentaram expansão populacional entre 70 e 100 mil anos, entretanto não podemos descartar a hipótese de expansão simultânea para estas três espécies, já que os intervalos de confiança destas análises se sobrepõem, o que sugere a forte influência de um fator ambiental comum. Ocypode quadrata, além de ter apresentado a história demográfica mais antiga, apresentou a maior diversidade genética, sendo também a espécie com a maior distribuição geográfica, sendo pancontinental, o que sugere ser a espécie mais resistente às mudanças ambientais. As espécies D. hanleyanus e O. quadrata, apresentaram baixa estruturação filogeográfica, o que sugere não haver barreiras biogeográficas efetivas para elas, e corrobora a hipótese de que larvas livres natantes são fator importante para o fluxo gênico elevado. Por outro lado sugerem uma estruturação populacional para M. mactroides (com uma possível barreira biogeográfica no sul de SP) e E. brasiliensis (barreira em Copacabana, RJ). De maneira geral estes dados reforçam a idéia de que só a capacidade dispersiva larval não é suficiente para predizer fluxo gênico e estruturação populacional em populações marinhas costeiras, mas sim uma combinação de fatores ecológicos intrínsecos de cada espécie, assim como os fatores geológicos históricos, como os ocorridos no Pleistoceno.

ASSUNTO(S)

invertebrados marinhos brasil, região sul brasil, região sudeste filogeografia evolucao : genetica diversidade genética

Documentos Relacionados