Ecologia e etnoecologia de quelonios no Parque Nacional do Jau, Amazonas, Brasil

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2003

RESUMO

Nesta tese foram investigadas relações entre populações ribeirinhas da bacia do Rio Negro e a fauna de vertebrados que ocorrem na área, sobretudo os quelônios aquáticos. As áreas estudadas entre 1997 e 2001 foram os Rios Jaú, Carabinani e Unini, que compõem a bacia de drenagem do Parque Nacional do Jaú (pNJ). Foram adotadas metodologias participativas (calendários de caça e pesca, coleta e fiçação de crânios dos animais consumidos), entrevistas (formas de uso e recordações de caça e pesca), observação direta de caçadas e pescarias e experimentos de pesca. Foram realizados dois anos de monitoramento do consumo de vertebrados, incluindo a composição da dieta e estratégias de caça e pesca. Foram estudadas as formas de uso dos quelônios incluindo freqüência de consumo, preferências, restrições, tabus, importância medicinal e comercialização, avaliando o possível impacto destas práticas culturais para conservação. Foram também investigadas as estratégias de captura dos quelônios aquáticos, enfatizando as interações entre práticas culturais e variáveis ambientais nos locais de pesca. Por último, realizou-se um estudo detalhado sobre a ecologia populacional da espécie de quelônio mais importante na alimentação dos ribeirinhos através da captura de indivíduos com o emprego da estratégia local mais comum e de aplicação viável ao longo do ano. Os peixes predominaram (pelo menos 21 espécies, 51,5% das refeições) tanto em espécies como em indivíduos no sistema de aquisição de proteína animal nativa, seguidos dos mamíferos (11 espécies, 27,6% das refeições), dos répteis (10 espécies, 15,2% das refeições), e por último das aves (7 espécies, 5,7% das refeições). Diferenças sazonais neste padrão foram detectadas somente com relação aos répteis, representados basicamente pelos quelônios aquáticos, que foram menos importantes durante a cheia junho e julho). Foram observadas situações específicas em que os moradores se utilizam de sua percepção e conhecimento para realizarem pescarias e caçadas altamente produtivas. Estes fatores são considerados quanto à sua implicação para a conservação da fauna local. Opostamente ao que tem sido considerado como padrão na bacia dos rios de água preta, os moradores do PNJ nunca ou raramente passam fome, e a ausência de carne nas refeições (2,38%) se restringe ao pico da cheia, quando a fauna aquática está dispersa. Os moradores conhecem todas as espécies de quelônios com ocorrência confirmada e identificam mais uma espécie ainda não registrada na área. Todas são consideradas comestíveis, embora existam restrições relacionadas com a posição do animal na rede alimentar e/ou sua importância na medicina caseira. O possível impacto destas restrições sobre as espécies é discutido. A captura de quelônios é altamente diversificada e sujeita a variação sazonal quanto à freqüência de uso, ao rendimento e à seletividade. A técnica mais comum (baliza, 37,5% das pescarias) apresentou elevado rendimento (17,9 kglpescador/dia) e especificidade, capturando principalmente o cabeçudo, Pe/tocepha/us dumeri/ianus. Algumas técnicas são utilizadas em situações específicas, intrinsecamente ligadas ao ciclo hidrológico anual da região. Dentre estas, a captura de fêmeas de tracajás (Podocnemis unifi/is) nos locais de desova ou em locais onde os animais se concentram, no verão, são consideradas mais impactantes. O índice de abundância de cabeçudos (kg/baliza) foi maior no inverno nas florestas de igapó, e em seguida nos lagos quando estes se encontram mais secos. Predominaram animais adultos, sobretudo fêmeas (64%), embora os machos fossem maiores (médias de 5,25kg e 356,4mm para machos e 3,71kg e 298,l mm para fêmeas). 85% dos animais estavam parasitados, independentemente dos fatores considerados. A temperatura corpórea apresentou acentuada variação espaço-temporal, sendo mais elevada no verão, e esteve fortemente correlacionada com a temperatura da água (r = 0,85; P <0,001). Embora a população amostrada esteja sob pressão de pesca, não foram detectados sinais de vulnerabilidade ou declínio

ASSUNTO(S)

ecologia humana pesca artesanal caça pesca

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