Ecologia caiçara : pesca e uso de recursos na comunidade da praia do Puruba

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2004

RESUMO

O litoral de São Paulo ainda conta com a presença de caiçaras (descendentes de índios e portugueses) que habitam a região, sobrevivendo, originalmente, da pesca e da agricultura de coivara, especialmente de mandioca. Os caiçaras exibem um amplo contato e dependência do ambiente natural, sendo, portanto de interesse para os estudos de ecologia humana. Neste contexto, os objetivos do presente estudo foram: analisar a pesca artesanal realizada pela comunidade caiçara da Praia do Puruba, com enfoque em teorias ecológicas como Forrageio Ótimo (Forrageio a partir do Lugar Central) e Territorialidade, investigando possíveis mudanças ocorridas num período de 10 anos; acompanhar a dieta dos moradores sob a perspectiva de nicho ecológico, verificando também eventuais alterações neste mesmo período, especialmente no que concerne ao consumo de proteína animal; investigar como os moradores desta comunidade alocam seu tempo entre as diversas atividades diárias e, finalmente, realizar uma abordagem etnotaxonômica de mamíferos, nas comunidades da Praia do Puruba e Sertão do Puruba. O estudo de pesca artesanal evidenciou uma diminuição na quantidade de pescado capturado, refletindo em alterações nas tecnologias utilizadas e no objetivo da pesca, a qual deixou de ser voltada à comercialização. A dieta local também sofreu alterações após 10 anos. Como um reflexo da diminuição da pesca, o consumo de peixes diminuiu, embora este ainda seja a principal fonte de proteína animal. Além disso, fatores como alterações da renda per capta e a incorporação de novos hábitos trazidos por neo-residentes (antigos turistas que se estabeleceram no local) também podem ser responsáveis por alterações nos hábitos alimentares. O estudo de alocação de tempo sugere um padrão bem demarcado de atividades para homens, mulheres e jovens (adolescentes e crianças), com clara definição de papéis. Aos homens cabem principalmente as atividades econômicas, enquanto mulheres ficam responsáveis pelas atividades domésticas. Embora jovens tenham maior tempo livre em relação aos adultos, as garotas (entre 6 e 15 anos de idade) ia apresentam uma maior proporção de atividades domésticas, enquanto as crianças (entre 1 e 5 anos de idade I r_ II dedicam a maior parte do tempo ao Jazer. O modelo empregado (Regressão Logística Múltipla - Logit) para determinar os fatores de influência no tempo de Jazer não se mostrou suficiente para explicar o padrão encontrado, embora tenha evidenciado a importância dos fins de semana, da idade e do estado civil (especialmente os homens) como fatores que influenciam positivamente o tempo destinado ao lazer. O estudo de etnotaxonomia evidenciou que as denominações dos mamíferos são, na maior parte das vezes, feitas por monomiais, o que se dá, no caso de algumas espécies, pela ausência de outras espécies similares na área. Binomiais, quando utilizados com alta concordância pela maioria dos entrevistados, referem-se, na maior parte das vezes, a espécies que têm ou já tiveram relevância na alimentação. Fatores ecológicos como habitat e guilda são os principais critérios utilizados pelos entrevistados na formação de etnofamílias de mamíferos. Concluindo, o presente estudo sugere que a comunidade em questão vem passando por profundas alterações no seu modo de vida, evidenciadas por mudanças na pesca e na alimentação, desencadeadas por fatores sócio-ambientais, como o aumento da exploração dos estoques pesqueiros pela pesca comercial, restrições na utilização do ambiente e crescimento do turismo. Alternativas de manejo devem ser propostas com rapidez, a fim de que seja possível conciliar o desenvolvimento econômico e turístico já em andamento com a manutenção do modo de vida local, de forma que não haja perda total da resiliência ambiental e social

ASSUNTO(S)

etnozoologia ecologia humana dietas alocação de recursos pesca

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