Avaliação do processo de dispensação de imunossupressores para transplantados renais, SES MG, 2008

AUTOR(ES)
FONTE

IBICT - Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia

DATA DE PUBLICAÇÃO

27/02/2012

RESUMO

Introdução: O fenômeno do envelhecimento populacional observado no Brasil tende a aumentar a demanda por serviços de saúde para doenças crônico-degenerativas. Atualmente, estima-se que mais de dois milhões de brasileiros sejam portadores de algum grau de disfunção renal, fato que tem sido agravado pelo aumento progressivo do número de indivíduos com doenças renais no Brasil. Em sua fase mais avançada, denominada doença renal crônica terminal- DRCT, ocorre perda progressiva e irreversível da função renal. A incidência e a prevalência de doenças renais crônicas elevadas implicam em manter grande número de pacientes em tratamento renal substitutivo (TRS), que inclui o transplante como uma de suas modalidades, no âmbito do SUS, que também disponibiliza medicamentos e acompanhamentos necessários ao pós-transplante. Esta situação tem gerado um alto custo para o sistema público de saúde brasileiro. Os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) aprovados pelo Ministério da Saúde recomendam a manutenção do estado de imunossupressão no transplante renal com a utilização de esquemas farmacológicos, onde o principal medicamento utilizado é a ciclosporina. Em Minas Gerais, o micofenolato de sódio é o imunossupressor mais dispensado pela Secretaria de Estado da Saúde (SES/MG) para os pacientes transplantados renais. Neste contexto, estudos que visem avaliar a eficácia e segurança das opções terapêuticas existentes e seu perfil de utilização, podem ser úteis ao planejamento e organização dos serviços de saúde, de modo a promover racionalidade em suas ações, evitar os perigos relacionados à saúde bem como o aumento exacerbado dos custos financeiros, devido à multiplicidade crescente de tecnologias novas em saúde. Objetivo: Avaliar a utilização dos medicamentos imunossupressores para manutenção de transplantes renais no estado de Minas Gerais. Métodos: O estudo tem dois componentes. O primeiro, uma revisão sistemática de literatura com metanálise, com o objetivo de identificar, sumarizar e avaliar, comparativamente, os dados relacionados à eficácia e segurança dos medicamentos imunossupressores azatioprina e micofelonato mofetila ou sódio (entérico), utilizados na terapia imunossupressora de manutenção em pacientes que realizaram transplante renal. Foi realizada uma busca dos artigos até julho de 2011, nas bases de dados MEDLINE, interface Pubmed, Literatura Latino-Americana em Ciências da Saúde LILACS, Grupo Renal Cochrane e a Central de registros de ensaios clínicos controlados Cochrane. Foram selecionados ensaios clínicos controlados randomizados e quaserandomizados, com duração maior que seis meses e que comparavam regimes farmacológicos incluindo os imunossupressores azatioprina, micofenolato mofetil ou entérico com qualquer combinação e dose em terapia de manutenção. Para avaliar a qualidade metodológica dos ensaios clínicos foram utilizadas a escala de Jadad modificada e a Ferramenta da Colaboração Cochrane. Para análise estatística foi adotado um software meta-analítico da Colaboração Cochrane (Revman 5.0). Os resultados dicotômicos foram expressos em risco relativo (RR) e tiveram sua heterogeneidade analisada utilizando-se qui-quadrado e I2. O segundo componente compreende um estudo de utilização de medicamentos, do tipo corte transversal, que visou avaliar o processo de dispensação de imunossupressores pela SES MG. A população do estudo foi constituída por todos os transplantados renais que solicitaram imunossupressores, por meio de abertura de processo naquela instituição, junto ao Programa de Medicamentos de Alto Custo (Componente Especializado da Assistência Farmacêutica), no ano de 2008. Foram selecionadas variáveis relacionadas: i. ao perfil demográfico (sexo e idade), ii. às características do processo (Gerência Regional de Saúde -GRS de origem, trâmite das etapas necessárias ao deferimento da solicitação e situação atual - deferido, indeferido ou sob avaliação), iii. aos medicamentos dispensados (apresentações, custo mensal e priorização no PCDT). A análise do trâmite do processo considerou sete etapas para o deferimento final dos medicamentos imunossupressores. Para a análise da adequação dos esquemas imunossupressores solicitados, foram consideradas, nos PDCT, as indicações gerais de priorização de medicamentos segundo os principais tipos de transplantes, obedecendo a uma sequência racional de continuidade em relação à terapêutica inicial de imunossupressão. Foram realizadas análises descritivas utilizando proporções, medidas de tendência central e de dispersão. Nas análises estatísticas foram empregados os testes de Qui-quadrado para comparação de proporções e o teste T de Student e Mann-Whitney para comparação de médias. A significância considerada foi de 5%. O software utilizado foi o SPSS® versão 17.0. Resultados: Na revisão sistemática, foram selecionados e incluídos na análise qualitativa dez estudos que compararam AZA versus MMF. Dentre esses, oito foram incluídos nas metanálises. Pode-se constatar pela literatura científica avaliada que o MMF apresenta resultados melhores para rejeição aguda, endossados em uma metanálise de 12 meses. Entretanto, não foram observados resultados estatisticamente significantes e favoráveis para os desfechos sobrevida do enxerto e sobrevida do paciente, que são os mais importantes para a determinação da terapia dos pacientes. Considerando os resultados de segurança, a maioria dos artigos verificou maior número de eventos adversos para os grupos que fizeram uso de micofenolato mofetila, tanto para seis, doze ou trinta e seis meses. Quanto ao estudo seccional, no ano de 2008 foram abertos 964 processos com o código Z94.0 referente ao transplante renal (CID-10), sendo que 915 (94,9%) desses solicitaram pelo menos um imunossupressor. Identificaram-se 687 pacientes responsáveis pelos pedidos, predominantemente do sexo masculino (n=423, 61,6%), com idade média de 42,9 ± 14,1 anos (mediana= 46, amplitude de 2 a 79 anos). Considerando o conjunto de solicitações, a grande maioria dos medicamentos (87,4%, n=1288) foi classificada como de 2ª escolha (o micofenolato de sódio, tacrolimo e sirolimo), sendo somente 12,6% (185) de 1ª escolha (azatioprina e ciclosporina), o que representa acréscimo de pelo menos 301% no custo em relação às terapias de 1ª escolha. Pode-se verificar que, no período analisado, o trâmite do processo levou em média cerca de 22 dias para se concluir, sendo observado um trâmite mais ágil no segundo semestre do que no primeiro. Comparando-se o perfil dos processos de pacientes que solicitaram medicamentos de primeira escolha ou mista com os que solicitaram esquemas de segunda escolha, a GRS-BH apresentou uma menor proporção de dispensação de medicamentos de primeira escolha em relação ao conjunto das demais GRSs (p<0,05). Avaliando-se o perfil do processo de dispensação dos medicamentos por origem da solicitação, pôde-se constatar ainda diferença estatisticamente significante quanto ao tempo de tramitação médio dos processos, com maior agilidade na GRS-BH. Conclusão: O perfil de eficácia e segurança advindo das evidências científicas atualmente disponíveis sugere fortemente que a farmacoterapia imunossupressora deveria levar em consideração outros aspectos além do medicamento, como características da população (fatores de risco imunológicos e não-imunológicos), do paciente e do doador, uma vez que não há uma justificativa comprovada cientificamente de superioridade de um medicamento sobre o outro, independente da situação clínica considerada. Por outro lado, o estudo seccional mostrou uma proporção de dispensação de medicamentos que favorece muito os medicamentos de segunda escolha. Tal comportamento, além de não seguir o PCDT, não é sustentado devidamente pelas evidências científicas a respeito da eficácia destes imunossupressores. Produções científicas atualizadas suscitam sérias discussões a respeito da utilização de medicamentos de segunda escolha em tão larga escala. É necessária uma maior cautela, incorporando-se evidências de alto nível aos PCDT, e estudos regulares a respeito do perfil de dispensação de medicamentos e dos seus usuários, de modo a imprimir maior qualidade e racionalidade nas ações de saúde. Os resultados obtidos por este estudo indicam a importância da utilização de métodos de avaliação de tecnologias de saúde, assim como de análises epidemiológicas, para otimização dos serviços tendo em vista os princípios do Sistema Único de Saúde

ASSUNTO(S)

saúde pública teses.

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