Auto-organização e contingência da biologia evolutiva: um estudo sobre os desafios de Stuart Kauffman e Stephen Jay Gould ao darwinismo

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2007

RESUMO

O objetivo deste estudo é contrastar a tese da auto-organização de Stuart Kauffman e a tese da contingência de Stephen Jay Gould com a visão darwiniana da evolução. Inicialmente, caracterizamos o darwinismo como o que Kim Sterelny e Paul Griffiths chamaram de "visão aceita da evolução", acrescida dos três princípios gouldianos que detalham o papel da seleção natural na teoria darwiniana. A tese da auto-organização pode ser caracterizada como nomológica, na medida em que procura mostrar como as leis da auto-organização são responsáveis por grande parte da ordem biológica. A tese da contingência, por outro lado, enfatiza o papel do acaso e da imprevisibilidade na evolução, podendo assim ser vista como a defesa de uma abordagem idiográfica para a biologia. Kauffman questiona o poder causal da seleção natural na produção do fenômeno adaptativo. Nesse sentido, argumenta que a auto-organização é uma espécie de pré-requisito para a ação da seleção natural. No entanto, argumentamos que, vista como a condição de possibilidade da ação da seleção natural, não se pode dizer que a auto-organização tome o lugar da seleção natural em causar adaptações. Por sua vez, Gould está preocupado com o poder explicativo do princípio de seleção natural. Gould defende que, dada a imprevisibilidade a longo prazo exibida pelo fenômeno evolutivo, o princípio de seleção natural é insuficiente para explicar a história da vida na Terra. Sterelny e Griffiths afirmam que a tese da contingência deve ser lida como a visão de que o fenômeno evolutivo não apresenta resiliência contrafatual. Sob essa e outras interpretações, procuramos mostrar que a tese da contingência é mal-sucedida ao desafiar o poder explicativo do princípio de seleção natural. Por fim, analisamos as bases epistemológicas das duas teses, mostrando que a tese da auto-organização se baseia em um conceito de lei notoriamente diferente daquele defendido pelos estruturalistas. A tese da contingência está assentada em uma posição clássica da epistemologia: a noção de que explicação e predição são, em algum sentido, simétricas. A partir daí, procuramos caracterizar a abordagem kauffmaniana como uma forma de ahistoricismo explicativo, aproximando-se daquela desenvolvida por R. A. Fisher e S. Wright em genética de populações. Caracterizamos a posição de Gould, por outro lado, como um contingentismo causal. Dado que nenhuma das duas teses nega que a seleção natural é a causa da adaptação, pode-se dizer que elas concordam no nível causal. Essa constatação faz delas compatíveis, e mesmo complementares, ao darwinismo. Além disso, enquanto elas aparentemente discordam no nível explicativo, as abordagens nomológica e idiográfica não são mutuamente excludentes, conforme atesta a coexistência de algumas disciplinas em outras áreas científicas.

ASSUNTO(S)

filosofia seleção natural sistemas auto-organizadores contingência (filosofia) filosofia

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