A pluralidade da verdade em Erasmo / The truth plurality in Erasmus

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2010

RESUMO

Há uma tradição platônica entre os grandes leitores da obra de Erasmo de Rotterdam, o Príncipe dos Humanistas, que se concentra sobre a cuidadosa síntese feita pelo mestre para superar a ruptura entre fé e razão, através da compatibilização da erudição pagã à cristã em uma mesma doutrina que significasse, na polifônica Europa renascentista, uma urgente unidade da verdade nada menos do que o componente estabilizador do amálgama grecoromano, judaico-cristão que hoje define o Ocidente. Em efeito, no Livro dos Antibárbaros, que editou em 1521, a cisão entre fé e razão provocada pelas especulações dos próprios escolásticos é superada por uma solução média entre a noção hebraica de uma divindade arbitrária e a noção grega de deuses inseridos na natureza e suas leis; as histórias grega, judaica e cristã são unificadas pela busca do Sumo Bem; as várias escolas filosóficas e correntes teológicas são reunidas em uma Philosophia Christi; o conhecimento divino e o conhecimento humano são reafirmados como pertencentes à mesma unidade, à mesma natureza e fundados na mesma razão; o conhecimento humano pode ascender gradativamente dos assuntos dos homens aos divinos; os Studia Humanitatis são necessários para a verdadeira evangelização e a correta interpretação da Bíblia e as disciplinas pagãs são assimiladas como descobertas inspiradas pela Divina Providência para a utilidade dos cristãos. No entanto, persistentes leituras da imensa obra de Erasmo abrem um horizonte onde se elevam inúmeros outros temas povoados por argumentos que podem ser agrupados em antíteses desconcertantes, o que dificulta seu tratamento ainda em termos platônicos. Já uma reflexão sobre a escrita erasmiana, a partir das concepções aristotélicas presentes na Retórica, tomadas como reconhecimento e explicação da autonomia e legitimidade da dedução retórica frente à dedução científica e dialética, permite que nos afastemos do cânon da leitura platonizante desta escrita. Como resultado, esta nova reflexão se vê livre para entendê-la não como um discurso irrefutável e imposto por longo exercício dialético, mas como um tecido de argumentos verossímeis, colhidos em uma miríade de fontes, agenciados com eloquência e capazes de constituir o que aparece como unidade totalizante, o efeito de unidade em meio à pluralidade da verdade em que de fato respiram os discursos retóricos. Escrita que almeja para seu autor a glória de obter em geral o assentimento rápido e espontâneo de seus leitores postulando um saber que é, sobretudo, uma pacificação sem armas. De fato, a solução aristotélica, ao reconhecer um status científico para a retórica e superar a complexa comparação e outras especulações indevidas, especialmente entre a retórica e a filosofia, propõe ricas e novas abordagens. Esta solução insere a arte oratória e seus efetivos discursos no quadro histórico das disputas entre os homens, que sob leis isonômicas, e em busca da glória devem agir pela palavra, e no quadro social das deliberações públicas, em que o saber retórico pode ser visto como resultado de um procedimento heurístico reiterado por gerações de retóricos e de um dinamismo uma mútua determinação entre um saber proposto pelo orador e outro detido pelo auditório e entre saberes de oradores concorrentes. Ambos os quadros convidam então a uma análise, respectivamente, da gênese e da natureza da escrita erasmiana a partir de uma perspectiva política.

ASSUNTO(S)

ethics Ética história das religiões history of religions humanism humanismo lutero luther philosophia christi platonic idealism pluralidade da verdade política politics reform reforma renaissance renascença retórica rhetoric sofistas sophists truth plurality

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