A formação do mercado de trabalho no Brasil : da escravidão ao assalariamento

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2003

RESUMO

Na presente tese, realiza-se um esforço de sistematização e periodização do longo e dificil processo de formação de um mercado de trabalho no Brasil. Ainda que o marco cronológico que cobre este processo se situe, em linhas gerais, no período 1850-1930, a tese discorre inicialmente sobre a especificidade do mundo do trabalho na economia colonial. Parte-se do pressuposto de que vigorava então um não-mercado de trabalho, pois os trabalhadores escravos não negociavam a sua força de trabalho. Se produziam mercadorias para o exterior, não participavam do mercado, inexistente. Paralelamente, o trabalho livre recuava diante da escravidão absorvente, transformando este amplo segmento de "desclassificados sociais" do Brasil rural em trabalhadores socialmente dispensáveis. Com o fim do tráfico de escravos, o Estado Nacional aciona um conjunto de políticas voltadas para a desescravização paulatina e para o disciplinamento do trabalho livre, além de uma política de terras que restringia o acesso aos pequenos proprietários. Trata-se de assegurar a disponibilidade do trabalho. No Nordeste, aproveita-se o ex-trabalhador escravo e o antigo morador, territorializando a mão-de-obra, enquanto no Sudeste dinâmico, em virtude da alta demanda de trabalho proveniente do café, conta-se com o concurso do imigrante europeu. Mesmo após a Abolição, o Brasil contaria quando muito com mercados de trabalho incompletos e regionalizados, onde as relações de trabalho não-capitalistas se destacavam, assim como o autoritarismo dos "empregadores". Mesmo no regime de colonato . paulista, apesar da relação de subordinação ao capital, o quase-assalariamento revelava-se predominante. A transfiguração do capital cafeeiro em capital industrial permitiria o surgimento do primeiro mercado de trabalho não-abortado no país, situado na cidade de São Paulo, durante as primeiras décadas do século XX. As suas marcas são a instabilidade ocupacional, a inexistência de direitos trabalhistas, a existência de um exército de reserva prévio e elástico, além da proletarização do conjunto da família. A nacionalização do mercado de trabalho, bem como a sua territorialização definitiva pós-1930, dependeria das novas condições criadas pela reprodução ampliada do capital em escala nacional, quais sejam: a instauração de um conjunto de direitos trabalhistas e sociais e as migrações internas, permitindo a gestação de uma superpopulação relativa agora criada para e pelo capital. Para tanto, fôra estratégico o abortamento do mercado de trabalho no Nordeste. O Estado Nacional promoveria então a regulação do trabalho, sob bases autoritárias, anulando a ação sindical, ainda que se aproveitando das reivindicações operárias dos anos pré-1930. Empreendia-se uma regulação segmentadora, pois assegurava quando muito a reprodução truncada da maior parte classe trabalhadora, bem como a manutenção de um subproletariado - que mantinha vínculos de subordinação indireta com o capital ou então vivia da realização de atividades eventuais e precárias, as quais não conformavam um estatuto do trabalho e nem conferiam reconhecimento social. Da inelasticidade do trabalho, engendrada pelo fim do tráfico, passou-se a dispor de uma massa de trabalhadores proletarizados crescentemente disponíveis, e uniformizados pela capital, mas trazendo como traço distintivo a extrema desigualdade de renda e de acesso a direitos sociais. Esta transição foi tudo menos espontânea, dependendo da ação do Estado e das elites dominantes que lograram manter o caráter privado e autoritário das relações de trabalho. Não se constituiu uma sociedade salarial, mas tão somente uma miriade de condições operárias, pouco distanciadas do subproletariado onipresente. A consolidação do mercado de trabalho pós-1930 - mesmo nos momentos de maior crescimento do produto e do emprego e de crescente diversificação das ocupações e das situações de classe - não permitiu superar as características que o arcaram durante a sua construção e regulação.

ASSUNTO(S)

mercado de trabalho-brasil escravidão salarios

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