Um breve elogio à leitura

AUTOR(ES)
DATA DE PUBLICAÇÃO

2007

RESUMO

A tese tem como objetivo evidenciar a centralidade da página como dispositivo de governamentalidade da racionalidade ocidental moderna, uma racionalidade que emergiu, no séc. XII, com a possibilidade da leitura silenciosa dada pela página, e que se disseminou com a imprensa, a partir do século XVI. Propõe-se, então, a mostrar que, na atualidade, a página cede essa centralidade para a page, que se constitui como dispositivo governamental de um mundo globalizado. Em conseqüência, a leitura, enquanto modo de subjetivação do leitor pela página, transforma-se em relação à page: da leitura centrada na escrita à leitura centrada na leitura (dos trajetos) da leitura. A “arte de governo” da página acontece numa forma de disposição da escrita que teve o poder de estabelecer o texto, tornando-o inteligível numa certa ordem do discurso, e de configurar um modo de pensar produzido por esse ordenamento. Já a “arte de governo” da page acontece numa clara desorganização daquela ordem. Pois, paradoxalmente, é o hipertexto, ou seja, a descentralização do texto produzida pelos links, que vai evidenciar a centralidade da page como dispositivo de governamentalidade das chamadas “sociedades de controle”. A governamentalização do Estado Moderno Ocidental centrou-se na página enquanto 1) instituição (nos seus procedimentos, análises, cálculos, reflexões e táticas) que tem por alvo a população leitora, por forma principal de saber a economia política (inteligibilidade) do texto e por instrumentos técnicos, os dispositivos de segurança da sintaxe e da gramática; 2) um ordenamento que dá proeminência a esse tipo de “arte de governo”, ao produzir uma série de dispositivos de governo (arquivos, bibliotecas, escolas, p.ex.) e o disciplinamento dos saberes (medicina, literatura, p.ex); 3) condição de possibilidade da passagem do estado de justiça da Idade Média para o estado administrativo, burocrático do séc. XVII, ou seja, para a governamentalização do Estado. Assim, a página é inerente a uma forma de governamentalidade. E ao se constituir como o centro da sua racionalidade, ela aparece como condição de possibilidade para a emergência dessa governamentalidade e como um dispositivo pelo qual esta se efetiva. Centrada na page, a governamentalidade vai constituir: 1) a população mundial como alvo; como forma de saber, a economia política da informação e da comunicação (TICs); e por instrumentos técnicos, os dispositivos de segurança (câmaras, senhas, programas de computador, etc.); 2) um ordenamento global incessante e mutável que dá proeminência ao e-governo, ao trabalho imaterial, aos saberes linkados no hipertexto; 3) uma condição de possibilidade da passagem do estado administrativo, burocrático, disciplinar, para o estado do controle, do acesso, da senha. Aqui, já não se trata mais da “arte de governo” da página. A governamentalização do Estado centrada na página chega até nós travestida, transmutada que foi pela page. Já não se trata daquela “arte de governo”. Já não é mais a página. Tudo é outra coisa. Nós também. Já somos outros. Porque lemos e somos lidos de outra forma.

ASSUNTO(S)

leitura linguística filosofia hábito de leitura tecnologia da informação : ensino

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