Caracterização de toxinas presentes em peçonha de vespas

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DATA DE PUBLICAÇÃO

2003

RESUMO

Peçonhas de vespas são capazes de produzir uma variedade de efeitos biológicos, tais como dor, edema, hipotensão, hepatotoxicidade e reações alérgicas. Com a exceção da peçonha da abelha Apis mellifera e de algumas (poucas) espécies de vespas sociais, as peçonhas de himenópteros brasileiros têm sido pouco estudadas. Neste trabalho, caracterizamos farmacologicamente as atividades nas peçonhas de três espécies de vespas sociais da família Vespidae (Polybia chrysothorax, Pseudopolybia compressa e Polybia rejecta) e duas espécies de hábitos solitários, da família Scoliidae, do gênero Pypper (pypper sp. 1 e Pypper sp. 2), todas da região nordeste do Brasil. Especificamente, avaliamos a atividade sobre músculo liso (íleo isolado de cobaia), a cardiotoxicidade em coração semi-isolado de barata, e a ação sobre neurotransmissão em nervo sensorial de crustáceo (siri azul, Callinectes danae) e em junção neuromuscular (preparação nervo frênico-diaftagmo) de camundongo. As peçonhas das três espécies sociais contraíram o íleo isolado de cobaia na faixa de 0.001-100 ~g/ml (dependendo da peçonha), com CEso de 0,25 :t 0,05 ~g/ml, 8,75 :t 1,25 ~g/ml e 7,65 :t 1,85 ~g/ml, (média:!:EPM, 1=4) para Polybia chrysothorax, Polybia rejecta e Pseudopolybia compressa, respectivamente. As peçonhas do gênero Pypper eram inativos neste tecido. A pré-incubação dos tecidos com atropina (antagonista dos receptores muscarínicos, 10 J.1M), metisergida (antagonista dos receptores 5-HT2 da serotonina, 10 JlM), e pirilamina (antagonista dos receptores HI da histamina, 10 f.lM) inibiu a atividade contrátil das três peçonhas sociais enquanto que o Hoe-140 (antagonista dos receptores B2 da bradicinina, 1 JlM) não afetou as respostas. Estes resultados indicam que as peçonhas sociais contêm aminas biogênicas (acetilcolina, histamina e serotonina) mas são destituídas de cininas. As três peçonhas (1-100 ~g) mostraram atividade cardiotóxica em coração semi-isolado de barata, sendo que as mais potentes foram P. chrysothorax e P. compressa; as peçonhas do gênero Pypper eram inativas nesta preparação. A investigação dos possíveis mecanismos responsáveis por este efeito através do uso de antagonistas/inibidores indicou que não houve envolvimento de aminas das peçonhas e que a causa mais provável era uma atuação a nível de canais iônicos, especialmente os de sódio e, em grau menor, os de potássio. A dosagem da atividade fosfolipásica das peçonhas mostrou a seguinte ordem de potência: P. chrysothorax/P. compressa>P. rejecta » Pypper spp., porém esta atividade parece contribuir pouco para os efeitos observados uma vez que a indometacina apenas retardou o início da cardiotoxicidade. Na neurotransmissão, as peçonhas de P. chrysothorax e P. compressa (100 Jlg cada) aumentaram a atividade elétrica espontânea (disparo de potenciais de ação) do nervo sensorial de crustáceo de forma semelhante ao efeito causado pela brevetoxina (10-6 M), uma toxina marinha que age no mecanismo de portão do canal de sódio. As peçonhas também inibiram o potencial de ação do nervo em experimentos de "sucrose gap", efeito este que foi abolido pela tetrodotoxina (10-6 M), bloqueador de canais de sódio voltagem-dependentes. Nestes experimentos, as peçonhas de P. rejecta e do gênero Pypper eram inativas. As peçonhas das duas espécies sociais P. chrysothorax e P. compressa (25-100 Jlg/rnl), mas não da social P. rejecta e das solitárias, inhibiram da neurotransmissão em preparações nervo fTênico-diaftagmo de camundongo (tempo para bloqueio de 50% da resposta contrátil: 40 :!: 5 min (n= 3) e 57 :!: 3 min (n= 3), respectivamente, na concentração de 100 Jlg/rnl). Esta inibição era irreversível por lavagem das preparações. As peçonhas sociais também despolarizaram a membrana da fibra muscular e da placa terminal da junção neuromuscular. Estes achados sugerem uma ação pós-sináptica com possível envolvimento pré-sináptico. As três peçonhas produziram alterações morfológicas no músculo do diaftagma compatíveis com a nuonecrose e correlacionada à sua atividade fosfolipásica. O ftacionamento das peçonhas de P. chrysothorax e P. compressa por HPLC em coluna de fase reversa CI8 resultou em vários picos. O principal destes da peçonha de P. chrysothorax foi seqüenciado. A seqüênciaobtida (ARSLLEGLGIRRGSA), indicou que o peptídeo pertence à família de peptídeos conhecidos como pompilitodotoxinas (pMTX), a qual contém duas isoformas, a-PMTX e J3-PMTX, purificados das peçonhas das vespas solitárias Anoplius samariensis e Batozonellus maculifrons, respectivamente. Esta toxina reproduziu a cardiotoxicidade em coração de barata e o bloqueio de neurotransmissão em crustáceos observados para a peçonha de P. chrysothorax. Os resultados deste estudo indicam que as peçonhas investigadas possuem várias atividades biológicas. A demonstração de que as ações cardio e neurotóxicas da peçonha de P. chrysothorax eram devidas em grande parte à presença de uma isoforma de PMTXs sugere que peçonhas de espécies de vespas sociais podem servir de fontes para moléculas com potencial utilidade como inseticidas.

ASSUNTO(S)

vespa veneno toxinas

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